sexta-feira, 19 de julho de 2013

Uma declaração utópica, ou talvez não - I


António José Seguro acaba de anunciar que não houve acordo com o PSD e o CDS para um compromisso de salvação nacional.

A declaração do secretário-geral do PS é um rol de boas intenções que qualquer português desejaria ver concretizado. Só se esqueceu do essencial, explicar onde vai buscar as verbas colossais para subsidiar o programa de governo que acabou de apresentar.

Está a contar com os credores de Portugal? Pode esperar sentado.
Está a contar em reduzir mais os salários e as pensões da classe média, até aos 485 euros do salário mínimo nacional? Já sofremos uma redução enorme e não vamos dar para esse peditório.

Não se importa com a subida das yields das obrigações de dívida soberana, nem com as altas taxas de juro dos 14 mil milhões de euros que o País vai ter de pedir emprestado nos próximos meses e que serão pagas pelos contribuintes.
Não se importa de fazer o País perder a credibilidade que tantos sacrifícios custou aos portugueses voltar a adquirir.
Não hesita em pôr o interesse do partido socialista à frente do interesse nacional.

Como as sondagens beneficiam o PS, não se importa de lançar o País em eleições antecipadas, sem olhar aos custos financeiros que tal atitude durante um programa de assistência financeira vai acarretar, inexoravelmente, para o depauperado bolso dos portugueses. Mas vai sair um governo minoritário porque o PS também rejeitou o pedido do Bloco de Esquerda para negociações com vista à formação de um governo, com a justificação de que “não tem sentido iniciar processos paralelos”.

Realçamos esta frase de Seguro,

"Muitos de vós perguntam-se: E agora? O que vai acontecer?
Cabe ao senhor Presidente da República decidir.
"

porque nos recorda uma declaração anedótica que produziu em Abril:

"Seguro — Estou disponível para substituir o governo.
Jornalista — Como pensa resolver este buraco de cerca de 1,3 mil milhões de euros
[criado pelo Tribunal Constitucional ao reprovar quatro normas do OE 2013]?
Seguro — Quem criou o problema que o resolva!"


O leitor pode ler as propostas do PS aqui e as propostas finais do PSD aqui.
Poderá ver que a maioria das propostas do PS são contrárias ao proprio acordo com a troika negociado e assinado pelo socialistas. E o PS sabe muito bem que essas exigências da Europa e dos credores são condição essencial para a troika continuar a emprestar dinheiro a Portugal.
Arquivamos a declaração integral de Seguro para lhe podermos chamar utópico — ou talvez, aldrabão — daqui a um par de anos:


"Boa tarde.

Durante esta semana batemo-nos para que:
Não houvesse mais cortes nas reformas e nas pensões
Não houvesse mais despedimentos na função pública
Não houvesse mais cortes salariais na função pública e não fosse aplicada a contribuição de sustentabilidade do sistema de pensões

Durante esta semana batemo-nos para que o Governo parasse com as políticas de austeridade, em particular, para que o Governo não aplicasse os cortes de 4.700 milhões de euros.
Durante esta semana trabalhámos para o aumento do salário mínimo nacional e das pensões mais baixas; e para a extensão do subsídio social de desemprego.
Durante esta semana, trabalhámos pela diminuição do IVA da restauração (de 23% para 13%) e por uma redução progressiva do IRC.

Durante esta semana, lutámos pela criação de um programa de emergência para apoiar os 500.000 portugueses desempregados (sem qualquer rendimento), mobilizando fundos comunitários para qualificação e formação profissional.

Durante esta semana batemo-nos contra a privatização da TAP, das Águas de Portugal, da RTP e da CGD.

Durante esta semana trabalhámos pelo equilíbrio e sustentabilidade das contas públicas, através do estabelecimento de uma regra para a despesa pública, que consiste na estabilização da despesa corrente primária, em particular na despesa directamente relacionada com rendimentos.

Durante esta semana, tudo fizemos para introduzir sustentabilidade na gestão da dívida pública, através da renegociação das maturidades dos empréstimos concedidos por credores oficiais, o diferimento do pagamento dos juros e de uma posição forte de Portugal na defesa de uma solução global e europeia para o problema das dívidas soberanas dos países da zona euro. A parte da dívida soberana superior a 60% do PIB deve ser gerida ao nível europeu, assumindo cada país a responsabilidade pelo pagamento dos juros correspondentes.

Durante esta semana lutámos pelo apoio ao investimento público e privado, nomeadamente para que os fundos comunitários sejam prioritariamente dirigidos a incentivos reembolsáveis e a componente nacional dos fundos comunitários destinada ao investimento não conte para o défice.

Durante esta semana fizemos o que devíamos.

Estivemos a lutar por soluções realistas para os graves problemas dos portugueses, das famílias e das empresas.

Propusemos a estabilização da economia, nomeadamente pondo
• Fim às políticas de austeridade e estabelecendo uma política de rendimentos, através de um Acordo de Concertação Social Estratégica que envolvesse

1) Estabilização de médio prazo do quadro fiscal e das prestações sociais;
2) Evolução dos salários em torno dos ganhos de produtividade, da situação económica do País, da taxa de inflação e dos ganhos de competitividade relativa com outras economias;
3) Aumento do salário mínimo e das pensões mais reduzidas
4) Reposição dos níveis de proteção social assegurados pelo complemento social para idosos e pelo rendimento social de inserção;
5) Valorização da contratação coletiva, como quadro adequado para a promoção da melhoria da produtividade nos diferentes sectores.

Durante esta semana, defendemos o investimento público e privado, a diminuição de custos de contexto, incentivos fiscais ao investimento, a criação de um Fundo de Fomento, o financiamento às empresas e uma medida para salvar empresas economicamente viáveis, em dificuldades de tesouraria.

Mesmo assim o PSD e o CDS inviabilizaram um “compromisso de salvação nacional”.

Este processo demonstrou que estamos perante duas visões distintas e alternativas para o nosso país: manter a direcção para que aqueles que, como o PSD e o CDS, entendem que está tudo bem.
Ou dar um novo rumo a Portugal para aqueles que, como nós, consideram que os portugueses não aguentam mais sacrifícios e que esta política não está a dar os resultados pretendidos.
Que fique claro para todos os portugueses o que cada um defendeu. A nossa proposta está escrita, fundamentada e à disposição de todos os portugueses no site do PS.

Recordo que este diálogo surge na sequência de uma grave crise política aberta pelas demissões do ministro Vítor Gaspar e do ministro Paulo Portas. Crise política a que se soma a tragédia social e a espiral recessiva em que o actual Governo mergulhou o país.
Recordo que, durante estes dois anos, o PS nunca foi chamado a dar o seu contributo, apesar dos nossos alertas e das nossas propostas alternativas. O actual Governo ignorou o PS.
Mesmo assim, o PS disse sim ao apelo do senhor Presidente da República. Não poderia ser de outra forma quando o interesse nacional nos chama e é o futuro dos portugueses que está em causa.
Quisemos um diálogo com todos.
Pariticipámos no diálogo de boa-fé.
Empenhámo-nos em alcançar um compromisso.
Eu próprio, como líder do PS, impus-me um silêncio, cancelei toda a actividade pública, garantindo assim a necessária descrição em prol do êxito deste compromisso. Infelizmente, nem todos assim procederam.

Quero agradecer ao Dr. Alberto Martins que chefiou a delegação do PS e aos drs. Eurico Brilhante Dias e Óscar Gaspar o trabalho incansável e a dedicação que colocaram nas conversações.


Muitos de vós perguntam-se: E agora? O que vai acontecer?
Cabe ao senhor Presidente da República decidir.

O que vos garanto é que, qualquer que seja a decisão do senhor Presidente da República, o PS vai continuar a bater-se pela aprovação destas propostas que visam a criação de emprego, o crescimento económico, o equilíbrio nas contas públicas, a gestão sustentável da dívida pública e uma verdadeira reforma do Estado.

O que vos garanto é que continuarei a trabalhar perto dos líderes europeus pela renegociação do nosso programa de ajustamento e para que a Europa aposte em políticas de crescimento e de emprego, e para que o BCE assuma um papel mais activo no financiamento do nosso país.

Este é o meu compromisso.
Um compromisso que assumo com cada um de vós, não ignorando as dificuldades que o nosso país atravessa, olhando a realidade com confiança e o horizonte com esperança.
Alguns olham para as limitações do país e resignam-se. Eu olho para as potencialidades dos portugueses e quero aproveitá-las.
Este não é o momento para fazermos o possível. Este é o momento para fazermos o que é necessário."



19 Jul, 2013, 20:43


Sem comentários:

Enviar um comentário