segunda-feira, 24 de março de 2014

BES, Portas e os vistos dourados: mais uma tríade lusa?


Um cidadão chinês com um visto gold foi detido por ser alvo de um mandado de captura internacional emitido pela Interpol a pedido das autoridades chinesas.

O programa de autorizações de residência para investimento (ARI) a cidadãos estrangeiros — os vistos gold — foi criado, em Outubro de 2012, pelo então ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Portas. A ideia é atribuir autorizações de residência por seis anos a estrangeiros que invistam pelo menos 500 mil euros na aquisição de imobiliário, transfiram capitais no montante de, pelo menos, 1 milhão de euros ou criem, pelo menos, dez postos de trabalho.

O cidadão agora detido pediu a autorização em Julho de 2013 e o visto gold foi concedido em Janeiro deste ano, apenas um mês antes da emissão do mandado de captura pela Interpol.
Durante o processo de averiguações que antecede a concessão de um visto, a China não informou Portugal sobre as suspeitas que recaíam sobre o cidadão que terá comprado uma casa de luxo em Cascais com dinheiro proveniente de crimes cometidos no seu país.

Segundo informação oficial do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Portugal atribuiu 772 autorizações de residência, até 19 de Março, a que corresponde um investimento no valor de 464 milhões de euros, quase totalmente aplicado na compra de imóveis. Destes vistos gold, 612 foram concedidos a cidadãos chineses não oriundos de Hong Kong, nem de Macau.
No Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) há uma lista com cerca de mais 400 cidadãos chineses à espera de obter um visto gold.

Sabe-se que o SEF já recusou o visto gold a 11 cidadãos estrangeiros por “incumprimento de requisitos”. Das candidaturas indeferidas, “cinco são relativas a investidores e seis a familiares”, uma das quais relativa ao pedido apresentado por um operacional das "tríades" chinesas — crime organizado chinês — que, desde 1990, estava referenciado na Interpol.
A procura dos vistos gold por parte de cidadãos chineses levou o director do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, Manuel Palos, a propor ao Governo, já este ano, a colocação de um inspector do SEF na China.

Para o vice-primeiro-ministro Paulo Portas, a detenção deste cidadão chinês, cuja transferência de capital foi feita através do banco BES e com recurso a uma sociedade de advogados, vem provar que o "crivo de segurança funcionou duplamente".


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Além de passarem a poder residir em Portugal, os beneficiários dos vistos gold podem circular no espaço Schengen por curtos períodos de tempo, sem necessidade de visto.
Donde se conclui que Portugal está a obter dinheiro só pelo facto de pertencer a um espaço formado por 26 países europeus* que aboliram passaporte ou qualquer outro tipo de controle de fronteira entre as fronteiras comuns, funcionando como um único país para viagens internacionais.
Mas o espaço Schengen foi criado com o objectivo de incentivar a livre circulação de mercadorias, informação, dinheiro e pessoas, proporcionando maior bem-estar aos seus cidadãos, não para fazer lavagem de dinheiro sujo.

A opinião de Portas de que o BES e certa sociedade de advogados formam um crivo de segurança, vale o que vale: registamos a notícia deste banco ter sido multado em 1,1 milhão de euros por infracçõesmuito graves” em Espanha. Quais? Simplesmente, duas infracções à normativa sobre prevenção de branqueamento de capitais.

Depois do caso dos submarinos, vemos Portas e o BES envolvidos, de novo, num programa de centenas de milhões. Sempre a mesma tríade, que monotonia!



* Dos vinte e oito estados-membros da União Europeia, apenas seis não fazem parte do Espaço Schengen — Bulgária, Croácia, Chipre e Roménia vão juntar-se a este espaço, mas a Irlanda e o Reino Unido escolheram opções de não participação.
A estes 22 países, somam-se 4 estados-membros da Associação Europeia de Comércio Livre (EFTA) — Islândia, Liechtenstein, Noruega e Suíça — que aderiram ao Acordo Schengen.


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