quinta-feira, 14 de agosto de 2014

TC viabiliza cortes salariais de Sócrates e chumba cortes nas pensões

14 Ago, 2014, 19:54


O Tribunal Constitucional (TC) viabilizou por unanimidade o restabelecimento dos cortes salariais na função pública e no sector empresarial público tais como foram aplicados, em 2011, pelo governo Sócrates, mas determinou (com dez votos a favor e três contra) que estes são constitucionais apenas este ano e em 2015 — acórdão 574/2014.

Ao invés, vetou (com dez votos a favor e três contra) a proposta de redução permanente nas pensões do Governo Passos Coelho, ao substituir a actual Contribuição Extraordinária de Solidariedade (CES) pela futura Contribuição de Sustentabilidade (CS) a partir de 2015.
Os juízes decidiram por unanimidade, no mesmo acórdão, nada dizer sobre o novo factor de actualização das pensões, alegando insuficiência de elementos.

Recorde-se que o actual Governo desenvolveu o processo legislativo respeitante a estas matérias — Decretos 264/XII e 262/XII da Assembleia da República — para que o presidente da República pudesse pedir a sua fiscalização preventiva ao TC, obrigando este tribunal a pronunciar-se antes da apresentação do Orçamento de Estado de 2015, que tem de ser entregue até 15 de Outubro.

Redução salarial

Há pouco mais de dois meses, o TC tinha declarado inconstitucional a regra da redução remuneratória do Orçamento do Estado para 2014, que vigorou de Janeiro a Maio e estabelecia o seguinte:
  • Para valores de remunerações superiores a € 675 e inferiores a € 2000, aplica-se uma taxa progressiva que varia entre os 2,5% e os 12%, sobre o valor total da remuneração;
  • 12% sobre o valor total das remunerações superiores a € 2000.

Agora o TC viabilizou a nova proposta do Governo de retomar o modelo de redução salarial do Orçamento de Estado de 2011, que foi apresentado pelo governo de José Sócrates e aplicado de 2011 até 2013, mas apenas até ao fim de 2015. Há uma tabela e um simulador aqui e a regra de redução salarial é esta:
  • Remunerações superiores a 1.500 euros e inferiores a 2.000 euros: redução de 3,5%
  • Remunerações iguais ou superiores a 2.000 euros e iguais ou inferiores a 4.165 euros: redução de 3,5% sobre o valor de 2.000 euros, acrescido de uma redução de 16% sobre o valor da remuneração total que exceda os 2.000 euros.
  • Remunerações superiores a 4.165 euros: redução de 10%.

Em relação a esta redução salarial, Joaquim Sousa Ribeiro explicou que a sua aplicação este ano e no próximo é permitida porque ainda está em vigor o procedimento por défices excessivos.
A partir de 2016, o presidente do TC considera que a situação de excepcionalidade orçamental deixa de existir, além de que o diploma fiscalizado não previa o faseamento da reversão dos cortes, pelo que estes passam a exceder os limites do sacrifício e violam o princípio da igualdade.

14 Ago, 2014, 20:22


Redução das pensões

O governo propunha substituir a CES, sempre assumida como provisória, por uma medida duradoura dirigida ao sistema geral de pensões, que entendia respeitar as orientações dadas pelo Tribunal Constitucional no acórdão de Dezembro de 2013.
A medida visava garantir a sustentabilidade do sistema de pensões públicas, tinha efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2015 e era composta por estas quatro componentes:

  • Uma contribuição de sustentabilidade (CS), com a seguinte regra de progressividade:
    Quando o valor mensal global das pensões de um único titular se situar
    • entre 1000 e 2000 euros: sofre um corte de 2% sobre a totalidade.
    • entre 2000,01 e 3500 euros, além do corte de 2% sobre 2000 euros, tem um corte adicional de 5,5% sobre o montante que exceda os 2000 euros.
    • superior a 3500 euros: corte de 3,5% sobre a totalidade;
      • tem um corte cumulativo de 15% sobre o montante que exceda 4611,42 euros (onze vezes o IAS = 419,22 euros) mas não ultrapasse 7126,74 euros (dezassete vezes o IAS);
      • tem um corte cumulativo de 40% sobre o montante que exceda 7126,74 euros.
  • Um aumento das contribuições dos trabalhadores para os sistemas de Segurança Social de 0,2 pontos percentuais, para os 11,2%, mantendo-se a TSU paga pelos empregadores em 23,75%;
  • Um aumento da taxa normal do IVA de 0,25 pontos percentuais, para os 23,25%, mantendo-se inalteradas a taxa mínima e a taxa intermédia. Esta receita adicional “reverterá integralmente para os sistemas de pensões”;
  • Um factor de equilíbrio, que tornará a taxa de actualização anual das pensões dependente da “relação entre as receitas e as despesas do sistema e reflectirá todas as alterações estruturais registadas nas variáveis demográficas e económicas que o caracterizam”.

Sobre a taxa de 40% que seria aplicada à parte das pensões que excede 7.126 euros, o governo comprometeu-se a reduzi-la a metade em 2016 e a anulá-la em 2017. E garantia que, no conjunto da Caixa Geral de Aposentações e do Regime Geral da segurança social ficavam totalmente isentos da CS mais de 87% dos pensionistas.
Fora do âmbito desta contribuição ficariam as pensões pagas a militares deficientes, os PPR do Estado e "as pensões e subvenções automaticamente actualizadas por indexação à remuneração de trabalhadores no activo", como sucede no caso de juízes e diplomatas.
Mesmo assim, a Contribuição de Sustentabilidade foi declarada inconstitucional por este tribunal.

A medida, diz o TC, "revela-se inteiramente indiferente às situações diferenciadas dos pensionistas que, apenas porque abandonaram a vida activa em momentos temporalmente diferentes, se encontram já numa situação mais gravosa por efeito da evolução legislativa em matéria de pensões, o que suscita sérias dificuldades no plano da igualdade, equidade interna e da justiça intergeracional".
"Nestas circunstâncias, o invocado invocado interesse da sustentabilidade do sistema público de pensões, realizado através de uma mera medida de redução do valor das pensões, (...), não pode ser tido como um interesse público prevalecente face à intensidade do sacrifício que é imposto aos particulares, afectando desproporcionadamente expectativas tuteláveis, violando assim o princípio constitucional da protecção da confiança".

O TC decidiu não se pronunciar sobre a nova fórmula de actualização do valor das pensões por "não dispor de elementos suficientes".

O Governo calculava arrecadar com esta medida 372 milhões de euros em 2015, quase metade do que capta com a actual CES.


14/08/2014 - 20:06

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Os juízes admitem que os cortes salariais se justificam devido ao défice excessivo e no contexto de recuperação económica em que o país vive, mas a partir de 2016 excedem os limites do sacrifício e violam o princípio da igualdade.
No entanto, e ao contrário do que afirmou o presidente do TC, para 2016 está previsto um défice público muito superior a 0,5%, ou seja, um défice excessivo na perspectiva do Tratado Orçamental da União Europeia.
Um osso que vai ficar para o governo que sair das eleições legislativas do Outono de 2015 e que, no futuro, irá ser roído pelos portugueses.

Para já, o pagamento integral das pensões, em 2015, vai ter uma consequência imediata: mesmo sem recorrer à bola de cristal, os contribuintes podem prever um aumento de impostos no valor de... 372 milhões de euros.


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