sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Eurogrupo dá mais quatro meses à Grécia


Os ministros das Finanças da zona Euro acordaram, em princípio, estender o programa de resgate da Grécia por quatro meses, para evitar uma crise de liquidez em Março que forçaria o país a sair do euro.

Obtido apenas na terceira reunião do Eurogrupo em dez dias, o acordo exige que, na próxima segunda-feira, o governo grego apresente uma carta ao Eurogrupo listando todas as medidas políticas que pretende tomar durante o restante período do resgate, para garantir que vai cumprir as condições do mesmo.

Se a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu e o FMI ficarem satisfeitos, os Estados-membros da Zona Euro vão ratificar a prorrogação, quando necessário através dos seus parlamentos, como lembrou o ministro das Finanças irlandês Michael Noonan:
"É um importante primeiro passo que esperamos que venha a conduzir a uma segunda etapa de sucesso na noite de segunda/manhã de terça-feira, mas depois há uma terceira etapa com as ratificações nos parlamentos [da Alemanha, Holanda, Estónia e Eslováquia]."

A firmeza dos outros 18 Estados-membros da zona Euro, que cerraram fileiras contra as pretensões do governo grego em beneficiar de financiamento europeu mas sem contrapartidas, isolou o primeiro-ministro radical Alexis Tsipras e forçou-o a um grande recuo político uma vez que ele havia prometido acabar com o programa de resgate, terminar a cooperação com a troika de credores internacionais e reverter a austeridade.

Todavia terá sido o conselho de governadores do Banco Central Europeu (BCE), que anteontem se reuniu para avaliar novamente a linha de liquidez de emergência (ELA) concedida aos bancos gregos, quem exerceu a pressão decisiva sobre o governo grego. Ao alterar de 65 para 68,3 mil milhões de euros o limite dos fundos disponibilizados, uma subida muito inferior aos 10 mil milhões de euros solicitados pela banca helénica para poder suportar a enorme fuga de depósitos, deixou os bancos na iminência de falirem no curto prazo.
Por sua vez o Mecanismo Único de Supervisão, o regulador para a banca europeia, alertou os bancos gregos para não emprestarem dinheiro às entidades públicas porque os tratados europeus não permitem que o programa ELA seja usado para financiar directamente os Estados-membros.

Confrontado com a exigência de um compromisso claro até ao final da semana, o ministro das Finanças grego, Yanis Varoufakis, enviou esta carta ao seu homologo holandês, Jeroen Dijsselbloem, presidente do Eurogrupo, pretendendo que a resposta dos seus colegas fosse apenas "sim", ou "não", e dada em reunião por teleconferência (negrito é meu):

Atenas, 18 de Fevereiro de 2015

Caro Presidente do Eurogrupo,

Ao longo dos últimos cinco anos, o povo da Grécia realizou esforços notáveis de ajustamento económico. O novo Governo está empenhado num processo de reforma mais amplo e profundo que visa melhorar de forma duradoura o crescimento e as perspectivas de emprego, alcançar a sustentabilidade da dívida e a estabilidade financeira, aumentando a equidade social e atenuando o custo social significativo da crise em curso.

As autoridades gregas reconhecem que os procedimentos acordados pelos Governos anteriores foram interrompidos pelas recentes eleições presidenciais e legislativas, e que, em resultado, várias disposições técnicas foram invalidadas. As autoridades gregas honram as obrigações financeiras da Grécia para com todos os seus credores, assim como afirmam a nossa intenção de cooperar com os nossos parceiros, a fim de evitar obstáculos técnicos no âmbito do Acordo-Quadro que reconhecemos como obrigatório no que diz respeito às suas disposições financeiras e processuais.

Neste contexto, as autoridades gregas estão agora a pedir a prorrogação do Acordo-Quadro de Assistência Financeira para um período de seis meses, a contar após a sua conclusão, período durante o qual vamos proceder em conjunto, e fazendo o melhor uso da flexibilidade dada pelo actual plano, com vista à sua conclusão bem-sucedida e avaliação com base nas propostas de, por um lado, o governo grego e, por outro, as instituições.

O objectivo da prorrogação solicitada de seis meses da duração do Acordo é:

a) Chegar a acordo sobre os termos financeiros e administrativos cuja implementação, em colaboração com as instituições, estabilizará a posição orçamental da Grécia, atingindo excedentes primários apropriados, garantindo a estabilidade da dívida e apoiando a realização dos objectivos orçamentais para 2015, tendo em conta a actual situação económica.

b) Assegurar, em estreita colaboração com os nossos parceiros europeus e internacionais, que quaisquer novas medidas serão totalmente financiadas, e ao mesmo tempo abster-se de acções unilaterais que prejudiquem as metas orçamentais, a recuperação económica e a estabilidade financeira.

c) Permitir ao Banco Central Europeu reintroduzir a cláusula de excepção [para as obrigações do tesouro gregas] de acordo com seus procedimentos e regulamentos.

d) Prolongar a disponibilidade das obrigações do FEEF [Fundo Europeu de Estabilização Financeira que financia em nome da zona Euro], que estão na posse do HFSF [Fundo Helénico de Estabilização Financeira], durante a vigência do Acordo.

e) Iniciar as conversações técnicas com vista à assinatura de um novo Contrato para a Recuperação e Crescimento [terceiro resgate] que as autoridades gregas desejam entre a Grécia, a Europa e o FMI, para dar seguimento ao actual Acordo.

f) Chegar a acordo sobre a supervisão no quadro da UE e do BCE e, no mesmo espírito, com o FMI durante o período alargado do Acordo.

g) Discutir o modo de desencadear a decisão do Eurogrupo de Novembro de 2012 relativamente a novas possíveis medidas sobre a dívida e a assistência para a implementação após a conclusão do Acordo prorrogado e enquanto parte do Contrato de acompanhamento [mecanismos de alívio de dívida previstos desde 2012].

Com o acima referido em mente, o governo grego exprime a sua determinação em cooperar estreitamente com as instituições da União Europeia e com o Fundo Monetário Internacional, de modo a: a) atingir a estabilidade orçamental e financeira, e b) permitir ao governo grego introduzir reformas substantivas e de longo alcance que são necessárias para restaurar os padrões de vida de milhões de cidadãos gregos através de um crescimento económico sustentável, emprego produtivo e coesão social.

Atenciosamente,
Yanis Varoufakis
Ministro das Finanças
Grécia


Depois de Atenas ter enviado a Bruxelas este pedido de prorrogação de seis meses, o ministro grego do Trabalho, Panos Skourletis, desvalorizou o pedido, afirmando que apenas estava em jogo o contrato de empréstimo assinado com a zona Euro: "O pedido é referente à extensão do acordo de empréstimo, não é para o programa de assistência em curso."

Vários países do euro ficaram descontentes com as declarações contraditórias das autoridades gregas e mostraram-se dispostos a deixar sair a Grécia da moeda única.

"A zona Euro está, certamente, mais estável e mais forte do que há cinco anos, pelo que a eventualidade hipotética de um dos seus membros sair deverá ter pouco impacto", disse o ministro estónio das Finanças, Maris Lauri, que fez notar que a Grécia não cairia na insolvência, se não quiser uma extensão do resgate europeu, pois obteve um superavit em 2014. Contudo, acrescentou, o país teria de passar a viver por conta própria.

O primeiro-ministro eslovaco Robert Fico, em entrevista ao Finantial Times, também disse que a Eslováquia encarava com "calma" a eventualidade da Grécia sair da zona Euro, se o país se recusasse a honrar os seus compromissos, tendo acrescentado ser "impossível" explicar aos eslovacos que tinham de pagar salários e pensões na Grécia.

Hoje, de manhã, foi a vez do ministro das Finanças de Malta, Edward Scicluna, dizer horas antes da reunião do Eurogrupo: "Penso que chegámos agora a um ponto em que vão dizer à Grécia 'se querem realmente sair, saiam'. E penso que eles vão levar isto a sério, porque a Alemanha, Holanda e outros vão ser duros e vão insistir que a Grécia pague de volta a solidariedade demonstrada pelos Estados-membros ao respeitar as condições."
O ministro de Malta criticou também o método de actuação de Alexis Tsipras e de Yanis Varoufakis: "Infelizmente para a Grécia, eles não sabem as regras e como o Eurogrupo trabalha. Eles são completamente novos e isso é negativo para eles."

Mas o aviso mais forte veio de Berlim, quando porta-voz de Wolfgang Schäuble considerou que a carta de Atenas não verificava os critérios acordados pelo Eurogrupo na segunda-feira, indo noutra direcção: “Na verdade, vai na direcção de um financiamento intercalar sem responder às exigências do programa [de ajustamento].”

Os esclarecimentos necessários exigiram o adiamento da reunião dos ministros das Finanças da zona Euro para as 16h30, em Bruxelas, para se poder realizar um encontro entre o ministro grego, Yanis Varoufakis, o homólogo alemão, Wolfgang Schäuble, o comissário europeu dos Assuntos Económicos, o francês Pierre Moscovici, a directora-geral do Fundo Monetário Internacional, Christine Lagarde, e o presidente do Eurogrupo, Jeroem Dijsselbloem.
O acordo aí delineado foi depois apresentado na reunião do Eurogrupo, tendo merecido a concordância de todos os ministros das Finanças. Pelas 20h começaram as conferências de imprensa e uma hora depois era divulgada a declaração do Eurogrupo (negrito é meu):

O Eurogrupo reitera o seu apreço pelos esforços de ajustamento notáveis realizados pela Grécia e pelo povo grego ao longo dos últimos anos. Durante as últimas semanas, envolvemo-nos, em conjunto com as instituições [Comissão Europeia, Banco Central Europeu e FMI], num diálogo intenso e construtivo com as novas autoridades gregas e atingimos hoje uma base comum.

O Eurogrupo toma nota, no âmbito do acordo existente, do pedido das autoridades gregas para uma prorrogação do Acordo-Quadro de Assistência Financeira (MFFA), que é sustentado por um conjunto de compromissos. O objectivo da prorrogação é a conclusão com êxito da avaliação [do programa grego] com base nas condições do actual acordo, fazendo o melhor uso da flexibilidade que será considerada em conjunto com as autoridades gregas e as instituições. Esta extensão também serve de ponte no tempo para discussão de um possível acordo de acompanhamento entre o Eurogrupo, as instituições e a Grécia.

As autoridades gregas vão apresentar uma primeira lista de medidas de reforma, com base no actual acordo, até o final de segunda-feira, 23 de Fevereiro. As instituições vão fazer uma primeira análise sobre se esta é suficientemente abrangente para ser um ponto de partida válido para uma conclusão com êxito da avaliação. Esta lista será melhor especificada, e então alvo de acordo com as instituições, até ao final de Abril.

Apenas a aprovação da avaliação final do acordo prorrogado por parte das instituições, permitirá qualquer desembolso da parcela remanescente [7,2 mil milhões de euros] do actual Programa FEEF e a transferência dos lucros [1,9 mil milhões de euros] de 2014 do SMP [programa de compra de valores mobiliários]. Ambos ficam novamente sujeitos à aprovação pelo Eurogrupo.

Tendo em vista a avaliação das instituições, o Eurogrupo chegou a acordo que os fundos, até agora disponíveis no buffer FHEF [Fundo Helénico de Estabilização Financeira] [11 mil milhões de euros], devem ser confiados ao FEEF [Fundo Europeu de Estabilização Financeira], livres de direitos de terceiros para o período de extensão do MFFA. Os fundos continuam a estar disponíveis para o período de extensão do MFFA e só podem ser usados para custos de recapitalização e resolução da banca. Só serão libertados a pedido do BCE/SSM [Mecanismo Único de Supervisão].

Nesta perspectiva, congratulamo-nos com o compromisso das autoridades gregas de trabalhar em estreita parceria com instituições e parceiros europeus e internacionais. Neste contexto, recordamos a independência do Banco Central Europeu. Também concordámos que o FMI vai continuar a desempenhar a sua função.

As autoridades gregas expressaram o forte compromisso com um processo de reforma estrutural mais ampla e profunda que visa melhorar de forma duradoura o crescimento e as perspectivas de emprego, garantindo a estabilidade e resiliência do sector financeiro, e melhorar a equidade social. As autoridades comprometem-se a implementar reformas há muito necessárias para combater a corrupção e a evasão fiscal e melhorar a eficiência do sector público. Neste contexto, as autoridades gregas comprometem-se a fazer o melhor uso do prosseguimento da prestação de assistência técnica.

As autoridades gregas reiteram o seu compromisso inequívoco de honrarem plena e atempadamente as obrigações financeiras para com todos os seus credores.

As autoridades gregas também se comprometeram a garantir o superavit orçamental primário [saldo positivo sem os juros da dívida] adequado ou os recursos de financiamento necessários para garantir a sustentabilidade da dívida, de acordo com a declaração do Eurogrupo de Novembro de 2012. As instituições, para a meta de superavit primário de 2015, vão tomar em consideração as circunstâncias económicas em 2015.

À luz desses compromissos, congratulamo-nos que, numa série de áreas as prioridades políticas gregas podem contribuir para um reforço e uma melhor aplicação do actual acordo. As autoridades gregas comprometem-se a abster-se de qualquer reversão de medidas e alterações unilaterais de políticas e reformas estruturais que teriam um impacto negativo nas metas orçamentais, na recuperação económica ou na estabilidade financeira, tal como avaliadas pelas instituições.

Com base no pedido, nos compromissos assumidos pelas autoridades gregas, no parecer das instituições, e no acordo de hoje, vamos lançar os procedimentos nacionais com vista a chegar a uma decisão final sobre a extensão do actual Acordo-Quadro de Assistência Financeira do FEEF para quatro meses, pelo Conselho de Administração do FEEF. Também convidamos as instituições e as autoridades gregas a retomarem imediatamente o trabalho que permitiria a conclusão bem-sucedida da avaliação.

Continuamos empenhados em fornecer um apoio adequado à Grécia até que recupere o acesso total ao mercado, desde que respeite os seus compromissos no horizonte acordado.

Friday, February 20, 2015 - 01:48
Excerto das duas conferências de imprensa, a da troika com Christine Lagarde (FMI), Pierre Moscovici (Comissão Europeia) e o representante do Banco Central Europeu, com Jeroem Dijsselbloem (Eurogrupo) entre estes últimos, e a do ministro das Finanças grego, Yanis Varoufakis.

20/02/2015 - 22:07


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Ficam assim adiadas as promessas que permitiram ao Syriza ganhar as eleições legislativas gregas em 25 de Janeiro — em especial, as subidas do salário mínimo grego para 876 euros e do limiar de pagamento de IRS para 12.000 euros —, bem como o recente perdão fiscal (que anularia 90% dos 76 mil milhões de euros que os gregos devem ao fisco e à segurança social) para quando conseguirem derrotar a corrupção e a tradicional evasão fiscal grega.

O governo de Alexis Tsipras vai ficar o fim-de-semana prolongado (segunda-feira é feriado na Grécia) a fazer um trabalho de casa que será avaliado na próxima terça-feira pela Comissão Europeia, Banco Central Europeu e FMI, ou seja, pelas equipas técnicas lideradas por Jean-Claude Juncker, Mario Draghi e Christine Lagarde e, se passar neste exame técnico, será aprovado pelos restantes 18 ministros das Finanças da zona Euro na reunião do Eurogrupo.

Não é um trabalho nada fácil: têm de elaborar uma lista de medidas de reforma de modo a manter este ano o superavit primário (saldo positivo, não contabilizando os juros da dívida) alcançado pelo governo de Antonis Samaras em 2014. Se as instituições julgarem que as reformas apresentadas pelo governo grego não cumprem o princípio de se compensarem financeiramente, para não colocar os objectivos orçamentais e de competitividade da economia em causa, “a Grécia estará em apuros e este acordo morto e enterrado”, reconheceu o próprio Yanis Varoufakis.
No entanto, o governo grego pode contar com o apoio técnico da troika CE/BCE/FMI para fazer o trabalho de casa...



Se o governo grego for capaz de passar nos exames técnicos de 24 de Fevereiro e do final de Abril, tem uma terceira etapa para ultrapassar logo a seguir. É que, em vez do prolongamento de seis meses pedido por Varoufakis, foram dados apenas quatro meses, o que coloca o final da vigência do empréstimo antes das amortizações de obrigações do tesouro previstas para Julho e Agosto, num total de cerca de 7 mil milhões de euros. E, ao contrário dos bilhetes do tesouro que podem ser pagos com a emissão de novos bilhetes, as obrigações do tesouro e a dívida ao FMI só podem ser amortizadas com o apoio dos parceiros europeus.

Além disso, ficou decidido que os 11 mil milhões de euros que estavam na posse da Grécia para capitalizar os seus bancos vão regressar ao FEEF, o fundo europeu de estabilização financeira. “É para garantir que não é usado pelo Estado”, explicou o presidente do Eurogrupo, Jeroem Dijsselbloem, com uma sinceridade desarmante.
No caso de Portugal, a parte não usada do montante destinado à banca permaneceu em Lisboa, mesmo depois do fim do programa.

A questão do BCE ter deixado de aceitar as obrigações do tesouro gregas como colateral para ceder liquidez aos bancos não foi abordada por ser uma instituição independente do Eurogrupo. Estas obrigações têm notação de 'lixo' das quatro grandes agências de rating mas beneficiavam de uma cláusula de excepção que foi retirada pelo BCE no início deste ano porque não tinha a garantia de que o programa de assistência grego, supervisionado por uma troika de instituições de que fazia parte, vai terminar com sucesso.

Em Março de 1985, a Grécia exigiu como contrapartida para aceitar a entrada de Portugal e de Espanha na CEE “um auxílio adicional no quadro das verbas para os PIM [ajuda às regiões mais desfavorecidas]: “dois mil milhões de dólares (cerca de 350 milhões de contos)”. Qualquer coisa como 1750 milhões de euros.
Desta vez foi servido aos gregos o prato frio (parece que foi quente) da vingança por Maria Luís Albuquerque que defendeu como uma leoa os 5000 milhões que, entre empréstimos e garantias, devem a Portugal.
Há 30 anos com o socialista PASOK, hoje com o socialista radical Syriza, os gregos lá vão mungindo a vaquinha europeia.


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