quarta-feira, 22 de abril de 2015

Auditoria revela infracções financeiras nas contas de 2013 do Tribunal Constitucional

A auditoria financeira do Tribunal de Contas, presidido por Guilherme d'Oliveira Martins, tinha de analisar a conta de gerência de 2013, verificar a contabilização das receitas e das despesas, bem como a regularidade e legalidade das operações subjacentes.

No seu relatório, o Tribunal de Contas refere, como sendo eventuais infracções financeiras, os pagamentos a Magistrados no que respeita as ajudas de custo:

Em 1 de Novembro de 2012, por alteração do procedimento antes seguido, sem que exista evidência de determinação formal por quem tinha competência para autorizar despesas, passaram a ser processadas e pagas aos Juízes Conselheiros as ajudas de custo por participação em sessão do TC sem dedução do abono diário do subsídio de refeição, contrariando o artigo 37.º do DL n.º 106/98 (…).

Assim, o pagamento do subsídio de refeição, em acumulação com as ajudas de custo por participação em sessão do TC, carecem de conformidade legal (…) pelo que, no período compreendido entre Novembro de 2012 e Dezembro de 2013, os pagamentos relativos ao abono do subsídio de refeição, no montante global de 12.329,98 €, são ilegais e indevidos e resultaram num dano efectivo para o erário público de igual montante (…).
(…)
Tais pagamentos indevidos, comprovados pelos documentos acima identificados, causaram dano efectivo para o erário público de 12.329,98 €, pelo que constituem eventual responsabilidade financeira reintegratória (…) imputável em regime de solidariedade (…) a:
a) Dulce Nídia Pinheiro da Fonseca Monteiro O’Neill Marques, Chefe de Divisão da DAF, pela ordem emitida, em 29 de Outubro de 2012;
b) Joaquim José Coelho de Sousa Ribeiro e Maria Manuela Pereira Baptista Lopes, Presidente e SG do TC, respectivamente, com competência delegada, que autorizaram os pagamentos.

No contraditório, o presidente do TC, Joaquim de Sousa Ribeiro, salienta que "são presentes ao signatário, para assinatura, largas dezenas de autorizações de pagamento (…) Já quanto aos vencimentos, são apresentados para assinatura, juntamente com as restantes autorizações, apenas mapas com verbas globais a pagar, que o signatário assina sem qualquer reserva ou prevenção dubitativa, uma vez que se trata de despesas decorrentes directamente de preceitos legais.
Pelos referidos mapas, o signatário não tem qualquer possibilidade de tomar conhecimento do que é pago a cada funcionário e qual a composição analítica de cada uma dessas prestações, o que só seria possível com a consulta dos respectivos processos individuais. Uma tal consulta é, por padrões mínimos de razoabilidade, inexigível, para este efeito. Sempre faltaria, por conseguinte, mesmo a ter-se por verificada qualquer das ilegalidades em causa — o que não se concede — a possibilidade de estabelecer o nexo de imputação subjectiva, pressuposto necessário tanto da responsabilidade reintegratória
(…), como da responsabilidade sancionatória", acrescenta Sousa Ribeiro.

Relativamente ao sistema de controlo interno do Constitucional, o Tribunal de Contas (TdC) refere:

O TC não elaborou as demonstrações financeiras previstas no POCP e os registos contabilísticos do orçamento_RP não asseguravam a fiabilidade e integridade das operações. O TdC regista a informação que, a partir de Janeiro de 2015, a totalidade do sistema contabilístico utilizará o POCP (…).

Constatou-se a inexistência de manual de procedimentos de controlo interno, designadamente, de normas específicas para o controlo da receita própria, do imobilizado, da utilização dos veículos e das existências. O controlo do imobilizado não é completo nem eficaz, não tendo sido contabilizados e inventariados os bens adquiridos através do orçamento_RP. Constataram-se falhas na organização dos processos individuais de pessoal e de aquisição de bens e serviços (que não têm sido publicitados no portal da internet), nas autorizações para a realização de trabalho extraordinário e na fixação de limiares de reembolso de despesas. O TdC regista as iniciativas para regularização dessas situações (…).

Constataram-se fragilidades operacionais quanto à receita cobrada pelo TC, encontrando-se em curso procedimentos para assegurar a plenitude dos registos contabilísticos ao controlo da receita cobrada na 4.ª Secção da SJ (que reverte para o Estado) (…). O TC não cumpria o princípio de unidade de tesouraria, situação entretanto regularizada com a transferência da quase totalidade do saldo para o IGCP (…).

No cômputo global o sistema de controlo interno não apresenta um grau razoável de eficácia na prevenção e detecção de erros e irregularidades, o que justifica a sua classificação de “Deficiente” (…).

Quanto à legalidade e regularidade, houve também falhas a apontar:

Constatou-se a atribuição, desde 2000, de veículo para uso pessoal (com cartão de combustível e via verde, com limiares definidos) a todos e a cada um dos Juízes Conselheiros. Dado que só o Presidente e a Vice-presidente do TC têm direito a veículo oficial, os restantes veículos são de serviços gerais inexistindo regulamentação adequada para a sua utilização e controlo (…).

As operações subjacentes de receita foram verificadas, numa base de amostragem, tendo sido revelado que, em 2013, o TC não contabilizou cerca de 13 m€ correspondente a uma parcela do accionamento de garantias bancárias (…).

O exame da documentação de despesa, numa base de amostragem, revelou que:
a) não foram contabilizadas transacções no montante de 21 m€ (…);
b) foram pagos suplementos de disponibilidade permanente a dois dirigentes que optaram pelo vencimento de origem, como forma de, no quadro da legislação do TC, os compensar do dever indisponível de isenção de horário (…).
c) pagou indevidamente o suplemento de forças de segurança a guardas da GNR e não lhes pagou o suplemento de disponibilidade permanente (…);
d) foram inadequados os processamentos a agentes da PSP, no TC e na PSP, dos suplementos de risco, de serviço nas forças de segurança e de disponibilidade permanente (…);
e) desde Novembro de 2012, foram processadas e pagas as ajudas de custo por participação em sessão do TC, sem dedução do abono diário do subsídio de refeição, no montante, até Dezembro de 2013, de 12 m€ (…).

Em conclusão, o Tribunal de Contas faz o juízo sobre a conta:

O juízo respeitante à fiabilidade dos documentos de prestação de contas de 2013 é desfavorável (no sentido desta expressão em auditoria financeira), em virtude da incidência dos seguintes erros e irregularidades: o sistema do controlo interno é deficiente; o sistema de controlo patrimonial não é eficaz inexistindo informação completa e detalhada sobre os bens em inventário; na contabilização da receita e da despesa no orçamento_RP não foram cumpridos os princípios e regras orçamentais relativamente a 1,4 M€; as operações subjacentes, que foram verificadas por amostragem, revelaram irregularidades (…).

Em contraditório, o Presidente do Tribunal Constitucional, Joaquim de Sousa Ribeiro, expressa "(…) o verdadeiro desgosto e a preocupação que causa o juízo que o Relato dos Auditores entende dever ser formulado sobre a conta de 2013". E prossegue: "Seguramente injusto perante o que é a realidade substantiva da orientação da gestão financeira deste Tribunal, e, no essencial, da sua prática, esse juízo afigura-se-nos também, a uma primeira análise — não dispondo embora de dados comparativos que permitam uma apreciação segura —, sem fundamento bastante".





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Tudo isto foi descoberto numa base de amostragem porque não é possível efectuar uma análise exaustiva. Simplesmente demolidor do rigor e da exigência que deve ser apanágio do TC e a pôr em causa a sua honorabilidade!

Acrescentamos que o TC gastou cerca de 7 milhões de euros ao longo do ano 2013, mais do que recebeu, portanto ficou com um saldo de encerramento inferior ao saldo de abertura.

O presidente do Tribunal de Contas, Guilherme d'Oliveira Martins, foi deputado do partido socialista de 1991 a 1999 e, novamente, de 2002 a 2005, tendo exercido funções nos governos de António Guterres (1995-2002), nomeadamente, foi secretário de Estado da Administração Educativa (1995-1999), ministro da Educação (1999-2000), ministro das Finanças (2001-2002) e ministro da Presidência (2000-2002).

Donde se conclui que, quer as eleições legislativas do próximo Outono sejam ganhas pelos socialistas ou pelos social-democratas, o Tribunal Constitucional vai entrar na ordem. Com a função pública e os pensionistas a poderem perder o melhor apoio e a terem de enfrentar tempos difíceis.


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