segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

A situação no Banif - I


Uma eventual medida de resolução do Banif, em 2016, não deverá ser igual à do BES. Pode haver divisão em "banco bom" e "banco mau", mas possivelmente serão penalizados os obrigacionistas sénior e os depósitos acima de 100 mil euros.




O Banif foi intervencionado pelo Estado no final de 2012, tendo recebido 700 milhões de euros através de um aumento de capital e mais 400 milhões em capital contingente (designados por "CoCos").
No total, foram 1,1 mil milhões de euros emprestados pela troika, mas o aumento de capital já está incluído no défice e na dívida pública.

O banco conseguiu devolver 275 milhões de euros dos "CoCos" mas falhou o prazo de reembolso (Dezembro de 2014) da última tranche de 125 milhões, o que motivou a abertura de uma investigação na Comissão Europeia, em Julho deste ano, para verificar se a ajuda ao banco cumpriu as regras sobre auxílios estatais.

Agora a equipa liderada por Jorge Tomé está a tentar vender a participação estatal — actualmente 60,53% do capital do Banif — a um investidor privado para evitar que Bruxelas considere ilegal a ajuda pública.

Quando, domingo à noite, a TVI noticiou que, se esse processo não tiver sucesso até ao final desta semana, o Governo de António Costa poderá avançar com uma medida de resolução para o Banif, a reacção do gabinete de Mário Centeno foi célere.
"O plano de reestruturação do Banif, tal como é de conhecimento público, está a ser analisado pela DG Comp. Paralelamente, decorre um processo de venda do banco nos mercados internacionais conduzido pelo seu Conselho de Administração. O Governo acompanha, como lhe compete, a evolução destes processos, garantindo a confiança no sistema financeiro, a plena protecção dos depositantes, as condições de financiamento da economia e a melhor protecção dos contribuintes", garantiu o Ministério das Finanças, já na madrugada desta segunda-feira, 14 de Dezembro, em comunicado enviado às redacções.

O banco liderado por Jorge Tomé também divulgou um comunicado onde dizia que as afirmações "não só não correspondem à verdade como não têm qualquer espécie de fundamento", prometendo que "não deixará de apurar em sede judicial toda a responsabilidade dos autores de tais 'notícias' e dos que contribuíram para a sua propagação, na defesa dos melhores interesses dos seus clientes, colaboradores e accionistas".

Inquirida Bruxelas sobre se está a acompanhar o processo de venda e está a par de outras alternativas para a instituição, designadamente uma medida de resolução, o gabinete de imprensa da Direcção-Geral da Concorrência da Comissão Europeia (DGComp) respondia assim ao Negócios:
"A Comissão Europeia está em contacto próximo e construtivo com as autoridades portuguesas" sobre a situação do Banif. Esses contactos estão a decorrer "tanto ao nível técnico como político" mas, "neste momento, não é possível antecipar desfecho ou o calendário de uma decisão" de Bruxelas.
Esta fonte oficial sublinha que "qualquer desfecho [sobre o Banif] estará em linha com as regras da União Europeia e assegurará a total protecção dos depósitos garantidos".

Novas regras de resolução de instituições financeiras

A nova regra de resolução de instituições financeiras, chamada Banking Resolution and Recovery Directive (BRRD), foi aprovada em 2014, teve aplicação facultativa em 2015 e tornar-se-á obrigatória a partir de 2016.

Esta "Directiva de Recuperação e Resolução Bancária" exige um espectro alargado de contribuições para o chamado "bail-in", prevendo que não só os accionistas e os detentores de dívida subordinada (obrigações mais arriscadas), mas também os detentores de dívida sénior e os depósitos acima da 100 mil euros sejam chamados a contribuir para o reforço do capital do banco, antes de ser injectado dinheiro público.

Será um dos factores a considerar na decisão sobre o Banif, caso não se encontrem investidores interessados em ficar com a participação accionista do Estado.

"O ‘bail-in’ irá aplicar-se potencialmente a todas as responsabilidades das instituições que não estejam seguras por activos ou capital" e "não se aplicará aos depósitos protegidos pelos sistema de garantias de depósitos, aos empréstimos interbancários de curto prazo (…), aos activos dos clientes ou a responsabilidades como salários, pensões ou impostos", lê-se na nota explicativa sobre a BRRD disponibilizada pela Comissão Europeia.
"Depois das acções de outros instrumentos similares irá, em primeiro lugar, forçar-se perdas equitativas nos detentores de dívida subordinada e depois, também equitativamente, nos detentores de dívida sénior" e "depósitos das PME e de pessoas, incluindo acima de 100 mil euros, serão preferidos sobre outros credores seniores", ou seja, só serão chamados depois de esgotadas as anteriores possibilidades.

Este novo modelo visa reduzir ao mínimo os encargos dos contribuintes na resolução de bancos, mas exige perdas a credores — obrigacionistas seniores e depositantes com saldos acima de 100 mil euros, em geral, empresas — que, até agora, estavam relativamente protegidos.
No caso do BES todos os depositantes, assim como a dívida sénior, transitaram, sem perdas, para o Novo Banco. A medida de resolução impôs perdas apenas aos accionistas e à dívida subordinada.

As medidas de resolução são negociadas entre os governos e as entidades europeias que têm como missão avaliar se as regras de concorrência e de ajudas de Estado estão a ser cumpridas. Quando está em causa a estabilidade financeira, estão previstas excepções às regras de "bail-in".

No final de Novembro o governo italiano avançou com a resolução de quatro instituições financeiras para, segundo a imprensa internacional, evitar as regras que entram em vigor em Janeiro.
A entrada em vigor da BRRD coincide também com a entrada em vigor de outros mecanismos da União Bancária, como o início do Fundo Europeu de Resolução e o Mecanismo Europeu de Resolução.

*



17:42

Jorge Tomé tem tentado vender a participação estatal — 70 mil milhões de acções adquiridas através de um aumento de capital de 700 milhões de euros e que correspondem actualmente a 60,53% do capital do Banif — a investidores privados chineses. Agora fala-se em fundos de private equity europeus e norte-americanos.

Há, porém, um problema de preço. O Estado comprou os títulos a 0,01 euro (Prospecto do aumento de capital de 2014, p.45). A cotação do Banif tem vindo a cair e o fecho de hoje foi 0,0008 euro. Portanto a participação do Estado, que não pediu a admissão das acções à bolsa, tem hoje o valor de mercado de 56 milhões de euros.

No caso do Novo Banco é o fundo de resolução suportado pelos bancos que arcará com os prejuízos. O contribuinte só será chamado a pagar a fatia que couber à Caixa Geral de Depósitos.

Agora, no Banif, o Estado é detentor de acções, até da maioria do capital do banco. Dado que o património do banco está muito desvalorizado, o banco tem de pagar ao Estado 125 milhões dos “Cocos” e ainda precisa de uns 150 milhões de capitalização, tudo isto soma muitas centenas de milhões de euros que nenhum investidor privado aceitará injectar no banco. Vai ser o contribuinte a pagar tudo.

Estamos perante um problema muito grave para ser resolvido por um governo minoritário suportado por uma maioria parlamentar onde se inclui num partido apóstolo da cartilha marxista que impõe a nacionalização da banca.

Outras opiniões:

JoaoTVale
13:46
Qualquer solução que seja encontrada para o Banif terá sempre uma perda/prejuízo para os actuais accionistas. Um Banco com intervenção do Estado ao nível da do Banif não é nunca uma boa opção de investimento, a não ser para quem queira ver a bolsa como um jogo de roleta. Ou muito me engano ou vamos assistir a uma solução tipo BES, com algumas pequenas diferenças, em que os actuais accionistas (pequenos ou grandes) irão perder todo o seu investimento.
A Banca (mundial, europeia ou portuguesa), em geral, está carregada de problemas (crédito malparado, crédito incobrável, obrigações de Estados quase falidos, etc.), os quais desde 2007/2008 têm vindo a ser assumidos gradualmente pelo sistema, de forma a que o mesmo não estoire. A Banca portuguesa, como é lógico, não foge à regra e a prova disso foram as ajudas que o Estado teve de fazer ao BPI, BCP, CGD e Banif que, tirando o caso do BPI (já devolveu toda a ajuda), ainda não conseguiram devolver grande parte dessas ajudas. E porquê? Porque os problemas são muitos e o dinheiro não estica. Banif já era.

micael
17:12
Eu, se fosse administrador de uma empresa ou um particular com depósitos superiores a 100.000 euros no Banif, tirava o dinheiro de lá. Better safe than sorrow.


Sem comentários:

Enviar um comentário