quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

Caso Raríssimas: directora-geral da Casa dos Marcos suspensa preventivamente


A direcção da associação Raríssimas decidiu instaurar um "procedimento prévio de inquérito" à actuação da directora-geral da Casa dos Marcos, tendo suspendido preventivamente Paula Brito da Costa, por um período de 30 dias, para evitar perturbação do inquérito.

Esta manhã, cerca de 50 funcionários da Casa dos Marcos, pertencente à associação Raríssimas — Associação Nacional de Doenças Mentais e Raras —, quase todos administrativos, concentraram-se em protesto à porta da instituição. Os restantes estavam a prestar serviços ou cuidados de saúde aos utentes.



Contestavam a entrada da ex-presidente da associação, e ainda directora-geral da Casa dos Marcos, que voltou esta quarta-feira à instituição, onde se encontravam também inspectores da Segurança Social. Paula Costa saiu ao fim da tarde.

À noite, foi anunciada pela direcção da Raríssimas a decisão de instaurar um "procedimento prévio de inquérito" à actuação da directora-geral, sendo Paula Brito da Costa suspensa preventivamente, por um período de 30 dias, para evitar perturbação do inquérito.



A declaração, sem direito a perguntas e lida aos jornalistas por Marta Balula, vogal da direcção da Raríssimas, diz textualmente:

Tendo em consideração os indícios que recentemente se tornaram públicos e que poderão constituir, entre outros, um ilícito laboral, a direcção da Raríssimas deliberou instaurar um procedimento prévio de inquérito para investigar a alegada violação dos deveres de sigilo, de obediência e de lealdade para com o empregador por parte de Paula Cristina de Brito Cardoso da Costa.

Considerando que a presença da ex-presidente no local de trabalho pode ser susceptível de perturbar as averiguações do procedimento de inquérito, foi decidido, nos termos do número 2 do artigo 354 do Código do Trabalho, proceder à suspensão preventiva por 30 dias, com efeitos imediatos.


Os trabalhadores que durante a manhã se concentraram à porta da Casa dos Marcos em protesto pela presença da ex-presidente da associação Raríssimas, e agora directora-geral da Casa dos Marcos suspensa de funções, estiveram reunidos com uma comissão nomeada pela direcção da Raríssimas.


*


Na ânsia de aumentar a dimensão daquela instituição particular de solidariedade social (IPSS) — com 147 funcionários é uma média empresa que já percorreu mais de meio caminho para ser uma grande empresa —, Paula Costa multiplicou os serviços administrativos — há departamento jurídico e departamento de marketing, por exemplo.
O monstro começou agora a devorá-la. A oposição fez circular um abaixo-assinado a pedir o despedimento de directora-geral da Casa dos Marcos que obteve 90 assinaturas.

A decisão da Raríssimas de instaurar um "procedimento prévio de inquérito" à actuação da directora-geral da Casa dos Marcos merece uma análise detalhada.

Note-se que o número 1 do artigo 128 do Código do Trabalho estabelece que o primeiro dever de um trabalhador consiste em “Respeitar e tratar o empregador, os superiores hierárquicos, os companheiros de trabalho e as pessoas que se relacionem com a empresa, com urbanidade e probidade”.

Ora no comunicado da direcção da Raríssimas são mencionados os deveres de lealdade e de obediência para com o empregador que não foram beliscados na reportagem da TVI do passado dia 9. E é escamoteado o dever de Paula Costa comportar-se com urbanidade (afabilidade, civilidade, cortesia) e probidade (honestidade e rigor), sobre o qual se centra, e se vê gravemente prejudicado, naquela chocante reportagem.

Parece que a direcção da Raríssimas pretende dar tempo aos trabalhadores da Casa dos Marcos para se acalmarem, enquanto identifica os cabecilhas da revolta e presumíveis autores das gravações ilegais exibidas na TVI. E pretende proporcionar a Paula Costa umas férias para descansar, reflectir sobre o seu comportamento arrogante e prepotente e reconhecer que gastou recursos financeiros daquela IPSS em despesas pessoais, enquanto continuam a fazer-lhe o pagamento da retribuição.

Os documentos comprometedores divulgados sobre Manuel Delgado, secretário de Estado da Saúde do actual governo e consultor da Raríssimas entre 2013 e 2014, coagiram-no a apresentar o pedido de demissão do cargo, o que saciou a sede de sangue da opinião pública.

Sobre Vieira da Silva, o ministro do Trabalho, da Solidariedade e da Segurança Social que antes de assumir o actual cargo foi vice-presidente da mesa da assembleia-geral da Raríssimas a título gracioso, ninguém conseguiu até agora apresentar documentos incriminatórios.
A viagem à Suécia da sua companheira, a deputada Sónia Fertuzinhos, realizada em 8 e 9 de Setembro de 2016 e paga pela Raríssimas, foi esquecida.

Até agora apenas a Organização Europeia de Doenças Raras (EURORDIS) mostrou que não tencionava ignorar o caso ao suspender a associação Raríssimas e a Federação Portuguesa de Doenças Raras (FEDRA), enquanto decorrem as investigações à gestão.




A competência e a capacidade de dinamização de projectos demonstrada por Paula Costa, fundadora da Raríssimas, impulsionadora da construção da Casa dos Marcos e directora-geral desta obra considerada ímpar, a nível europeu, que mereceu prémios e visitas de personalidades estrangeiras, como foi a da rainha de Espanha, é incontestável.

Se nada mais houver, senão os documentos divulgados na reportagem da TVI, a via mais fácil e rápida de restabelecer o prestígio internacional da associação Raríssimas e não pôr em risco os donativos canalizados para esta, e para as outras instituições privadas de solidariedade social portuguesas, será abafar o caso e depois restaurar a imagem de Paula Costa.

O seu despedimento de directora-geral da Casa dos Marcos projectaria salpicos de lama sobre o ministro do Trabalho, da Solidariedade e da Segurança Social, permitindo à oposição PSD-CDS discutir, de novo, responsabilidades e negligências de Vieira da Silva, lançando-se na peugada de um ministro que António Costa tudo fará para manter no governo, não só porque é experiente, mas também um peso pesado do partido socialista.

Além disso, logo a seguir à reportagem da TVI, Paula Brito da Costa sofreu uma profunda penalização ao ser obrigada a afastar-se do cargo mais prestigiado da associação Raríssimas da qual ela foi associada fundadora — a presidência da Direcção.

O nepotismo, o amiguismo, a corrupção passiva e activa, a promiscuidade entre políticos e sociedade civil tornaram-se o pão nosso de cada dia desta democracia sui generis e deixaram de preocupar os portugueses. Pelo menos, enquanto houver dinheiro nos bolsos.



Paula Brito da Costa, presidente da Direcção até 12 de Dezembro de 2017, com a deputada Sónia Fertuzinhos, Joaquina Teixeira (vice-presidente da Direcção até Maio de 2017), Ricardo Chaves (tesoureiro da Direcção desde finais de 2016 até Junho de 2017), Nuno Peixoto Branco (director do departamento de recursos humanos) e Marta Balula (vogal da Direcção).
Os estatutos da Raríssimas estabelecem que a Direcção é composta por nove membros, dos quais um presidente, um vice-presidente, um tesoureiro, um secretário e cinco vogais.


Sem comentários:

Enviar um comentário